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Funcionários souberam de demissões pela imprensa. Hotel está em recuperação judicial e teve o prédio vendido

SÃO PAULO — O Hotel Maksoud Plaza, um dos ícones de São Paulo, fechou as portas oficialmente nesta terça-feira após uma crise que se arrasta há mais de uma década e envolve litígios societários, passivos trabalhistas e dívidas com fornecedores.

O empreendimento está em recuperação judicial desde o ano passado. Os cerca de 170 funcionários do cinco estrelas já haviam recebido há dias a orientação de que não deveriam aceitar reservas para depois do dia 7, mas tiveram a confirmação oficial do encerramento das atividades primeiramente pela imprensa.

Henry Maksoud Neto, o atual administrador do hotel, deu uma entrevista ao jornal Valor Econômico sobre o fim do empreendimento publicada antes de uma reunião que teve com os colaboradores na manhã desta terça, quando o prédio icônico da Bela Vista, a poucos metros da Avenida Paulista, já estava rodeado por grades e a entrada bloqueada.

Já no estacionamento, em frente à fachada, seguranças impediam o ingresso de não funcionários ao local.

A Laspro Consultores, administradora judicial do caso de recuperação, uma espécie de síndica do processo nomeada pelo juiz, afirma nos autos que também foi informada do fechamento pela mídia.  A rigor, deveria ser informada de todos os passos financeiros e legais do hotel com antecedência.

Já os locatários de estabelecimentos comerciais localizados no hotel foram avisados horas antes dos funcionários.

O Maksoud Plaza é considerado um dos símbolos arquitetônicos de São Paulo, e está localizado na esquina da rua São Carlos do Pinhal com a Alameda Campinas, a duas quadras da Avenida Paulista.

Na lista de hóspedes ilustres, Thatcher e João Gilberto

Inaugurado em 1979, chegou a hospedar grandes artistas, políticos e empresários.

Na lista de ex-hóspedes ilustres, estão a ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, o então secretário-geral da ONU Kofi Annan, o cantor João Gilberto, e as bandas de rock Rolling Stones e Guns N’Roses.

O hotel também já recebeu shows de Frank Sinatra e Julio Iglesias. A estimativa da companhia é de que mais de 3 milhões de pessoas tenham se hospedado ali em 42 anos de operação.

A empresa está em recuperação judicial desde setembro do ano passado, quando listou dívidas de R$ 82 milhões. Nos autos, o hotel atribuía à pandemia o fracasso do empreendimento, embora a crise da marca precedesse em ao menos uma década o surgimento do coronavírus.

O hotel foi administrado em seus anos finais por Henry Maksoud Neto, neto do fundador da marca, morto em 2014. Henry Neto trava uma briga com o pai, Cláudio Maksoud, e o tio, Roberto Maksoud, pela herança.

O passivo das controladoras do hotel, Hidroservice e HM Hotéis, chega a R$ 845 milhões. A dívida renegociada na reestruturação das empresas chega a R$ 300 milhões, incluindo dívidas em disputa judicial e com o fisco, que não entram na recuperação judicial. No processo judicial, os débitos submetidos ao plano foram reduzidos de R$ 110 milhões para R$ 60 milhões.

O fim definitivo das operações do hotel ocorre após um acordo entre Henry Neto e os irmãos Jussara e Fernando Simões, controladores do grupo JSL, de logística e transportes.

Os Simões aremataram o prédio do hotel em 2011 por cerca de R$ 70 milhões em um leilão judicial que foi realizado para quitar uma dívida trabalhista de R$ 13 milhões.

O hotel e Henry Neto iniciaram, então, uma briga para anular o certame, sob o argumento de que, na data de sua realização, o passivo trabalhista já havia sido quitado.

A assessoria de Henry Neto afirmou ao GLOBO que o acordo foi proposto inicialmente pelo juiz à frente da recuperação judicial como forma de destravar a venda de outros imóveis da empresa insolvente em leilões.

Os Simões, ainda segundo representante de Henry Neto, assentiram em fazer a correção monetária do valor do lance que vencera o leilão de 2011. Ao todo, vão pagar pelo imóvel R$ 132 milhões. Não se sabe o destino que os novos donos darão ao local.

Os demais leilões de ativos seriam realizados no primeiro semestre de 2022 e incluem imóveis em Manaus e na região metropolitana de São Paulo.

O valor arrecadado nos certames será usado para pagar dívidas do Maksoud Plaza, que terminará o processo praticamente sem ativos, apenas com a marca.

Funcionários do Maksoud Plaza posam para foto publicada nas redes sociais do hotel no dia do anúncio do fechamento do local Foto: Divulgação
Funcionários do Maksoud Plaza posam para foto publicada nas redes sociais do hotel no dia do anúncio do fechamento do local Foto: Divulgação

Questionamento judicial

Apesar dessas afirmações, a Laspro, administradora judicial do processo de recuperação do Maksoud Plaza, afirmou no processo nesta terça-feira que “foi até o hotel para constatação das informações recebidas através da mídia” sobre o encerramento das atividades do local.

O documento afirma que a consultoria, então, foi ao hotel, encontrou o local fechado com grades e seguranças na porta. Só aí, ao ligar para o telefone de Henry Neto e questionar sobre o fato, a administradora judicial foi informada que o hotel seria fechado e que os funcionários cumprirão aviso prévio até dia 27 de dezembro.

Na petição, a Laspro coloca em dúvida a viabilidade do plano de recuperação aprovado pelo hotel em junho deste ano e que não previa o acordo com os Simões.

“Esta subscritora (a Laspro) requer a intimação das recuperandas (Maksoud Plaza e suas controladoras) para que apresentem manifestação em caráter de urgência, no prazo de 24h (vinte e quatro horas) para esclarecimentos da situação das atividades desempenhadas pelo hotel e da viabilidade do plano de recuperação judicial”, pede a administradora judicial ao juiz do caso.

Em nota, a empresa gerida por Henry Neto diz que a Laspro foi informada “por e-mail e em contato telefônico com o CEO (presidente) da empresa sobre a decisão do grupo e dos empresários Fernando e Jussara Simões de entrar em acordo que considera válida a arrematação, em 2011, por estes empresários, do prédio onde funcionava (…) o Hotel Maksoud Plaza. No entanto, o administrador judicial peticionou ao juízo responsável pelo processo na data de hoje (terça) pedindo informações”.

Segundo o Maksoud Plaza, a consultoria “acompanhou e anuiu com as negociações para este acordo de validação, que significou o abandono dos recursos que questionavam a arrematação judicial de dez anos atrás”.

“Não houve venda do hotel – hipótese em que o juízo responsável pelo processo de recuperação judicial teria de autorizar a transação –, mas um acordo (…) resultado de uma mediação entre as partes sugerida em incidente dentro do processo determinado pelo próprio juízo responsável”. Essa possibilidade, diz o documento, era de conhecimento da Laspro.

Continuidade em risco

O Maksoud Plaza diz ainda que “prosseguirá no segmento de hospitalidade, utilizando a marca Maksoud Plaza” e que “em breve anunciará novidades”, sem precisar detalhes.

“Apesar do fechamento do Hotel, a HM Hotéis prosseguirá honrando seus compromissos firmados no processo de recuperação judicial, assim como arcará com a indenização integral de todos os colaboradores dispensados. Os clientes que tinham reservas futuras no Maksoud Plaza serão reembolsados”, diz o hotel em nota.

O Frank Bar, até então localizado no saguão do hotel e famoso por seus drinks e pelos seus shows de piano, também foi fechado. Os contratos com os demais restaurantes e cafés localizados no saguão do edifício serão rescindidos.

Pessoas familiarizadas com o assunto afirmam que os locatários de pontos comerciais localizados no hotel só foram avisados do encerramento das atividades na noite da segunda-feira, horas antes dos funcionários.